O meu desabafo nas palavras de Rui Barbosa, uma respostas para os que me elogiam com sinceridade, elogiam por gozação e, criticam para maculação da imagem digna , que por muito esforço fora construída na fonte da luta, humildade e mais do que tudo, fundada na fé inexorável no Deus todo poderoso. Assim o texto:
(…)
Tomai
exemplo, estudantes e doutores, tomai exemplo das estrelas da manhã,
e gozareis das mesmas vantagens: não só a de levantardes mais cedo
a Deus a oração do trabalho, mas a de antecedentes aos demais,
logrando mais para vós mesmos, e estimulando os outros a que vos
rivalizem no ganho bendito... Há estudar, e estudar. Há trabalhar,
e trabalhar. Desde que o mundo é mundo , se vem dizendo que o homem
nasce para o trabalho: homo nascitur ad laboren. Mas trabalhar é
como o semear, onde tudo vai muito das sazões, dos dias e horas. O
cérebro, cansado e seco do laborar diurno, não acolhe bem a
semente: não recebe fresco e de bom grado, como a terra orvalhada.
Nem a colheita acode tão suave às mãos do lavrador, quando o
torrão já lhe não está sorrindo entre o sereno da noite e os
alvores do dia....Assim, todos sabem que para trabalhar nascemos. Mas
muitos somos os que ignoramos certas condições, talvez as mais
elementares, do trabalho, ou, pelo menos, mui poucos os que as
praticamos. Quantos serão os que acreditam que melhores
trabalhadores sejam os melhores madrugadores? Que os mais estudiosos
não sejam os que oferecem ao estudo os sobejos do dia, mas os que o
honram com as primícias da manhã....Estudante sou. Nada mais. Mau
sabedor, fraco jurista, mesquinho advogado, pouco mais sei do que
saber estudar, saber como se estuda, e saber que tenho estudado. Nem
isso mesmo sei se saberei bem. Mas, do que tenho logrado saber, o
melhor devo ás manhãs e madrugadas. Muitas lendas se têm
inventado, por aí, sobre os excessos da minha vida laboriosa. Deram,
nos meus progressos intelectuais, larga parte ao uso em abuso do café
e ao estímulo habitual dos pés mergulhados n` água fria . Contos
de imaginadores. Refratário sou ao café....Ao que devo, sim, o mais
dos frutos do meu trabalho, a relativa exabundância da sua
fertilidade , a parte produtiva e durável da sua safra, é ás
minhas madrugadas. Menino ainda, assim que entrei ao colégio
alvidrei, sem cessar, toda a vida. Eduquei nele o meu cérebro , a
ponto de espertar exatamente á hora, que comigo mesmo assentara, ao
dormir. Sucedia, muito amiúde, encetar eu a minha banca de estudo a
uma ou às duas da antemanhã. Muitas vezes me mandava meu pai volver
ao leito; e eu fazia apenas que obedecia, tornando, logo após,
aquelas amadas lucubrações, as de que me lembro com saudade mais
deleitosa e estranhável... Tenho, ainda hoje, convicção de que
nessa observância persistente está o segredo feliz, não só das
minhas primeiras vitórias no trabalho, mas de quantas vantagens
alcancei jamais levar aos meus concorrentes, em todo o andar dos
anos, até á velhice. Muito há que já não subtraio tanto às
horas da cama, para acrescentar às do estudo. Mas o sistema ainda
perdura, bem que largamente cerceado nas antigas imoderações .Até
agora nunca o sol deu comigo deitado e, ainda hoje, um dos meus raros
e modestos desvanecimento é o de ser grande madrugador, madrugador
impenitente...Mas senhores, os que madrugam no ler, convém
madrugarem também no pensar. Vulgar é o ler, raro o refletir. O
saber não está na ciência alheia, que se absorve, mas,
principalmente, nas ideias próprias, que geram dos conhecimentos
absorvidos, mediante a transmutação , por que passam, no espírito
que os assimila. Um sabedor não é armário de sabedoria armazenada,
mas transformador reflexivo de aquisições digeridas...Já se vê
quanto vai do saber aparente ao saber real. O saber da aparência crê
e ostenta saber tudo. O saber de realidade, quanto mais real, mais
desconfia, assim do que vai aprendendo, como do que elabora. Haveis
de conhecer, como eu conheço, países, onde quanto menos ciência se
apurar, mais sábios florescem.... Há, sim, dessas regiões por esse
mundo além. Um homem (nessas terras de promissão) que nunca se
mostrou lido ou sabido em coisa nenhuma, tido e havido é por
corrente e moente no que quer que seja; porque assim o aclamam as
trombetas da política, do elogio mútuo, ou dos corrilhos pessoais,
e o povo subscreve a néscia atoarda. Financeiro, administrador,
estadista, chefe de Estado, ou qualquer outro lugar de ingente
situação e assustadoras responsabilidades, é a pedir de boca, o
que se diz mão de pronto desempenho, fórmula viva a quaisquer
dificuldades, chave de todos os enigmas...Tenham por averiguado que,
onde quer que o colocarem, dará conta o sujeito das mais árduas
empresas e solução aos mais emaranhados problemas.
Rui
Barbosa , no livro Oração aos Moços, páginas 37 a 39, editora
Russel, Série Ouro, 3ª edição, 2007.
(...)
O meu canto por palavras, a resposta para não dizer que fiquei no silêncio da culpa, apesar de que, em muitas situações o silêncio também é uma extraordinária resposta.
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